UTMB, uma corrida diferente

Quando comecei a correr, nunca pensaria que um dia fizesse uma corrida com a mítica marca de 100 km, muito menos provas de 100 milhas (168 km).
Com o decorrer do tempo essa ideia absurda que nos persegue quando começamos, deixa de fazer sentido e ousadamente somos levados a achar que somos capazes.
Essa ousadia fez com que terminasse a minha 4ª prova de 100 milhas! O UTMB.
Para mim e com toda a certeza para centenas e centenas de “insanos” atletas esta é a prova onde todos queremos estar à partida e orgulhosamente vestir o colete de finisher.
Porque será que todos queremos estar nesta prova?
Será pelo misticismo que se criou à sua volta? Será pela qualidade dos atletas que estão à partida? Será que está na moda? Não sei….
O que sei é que sentir todas aquelas sensações da partida, com a chuva a cair copiosamente, o colorido frenético provocado pelos equipamentos de 2300 atletas, a contagem final e o apoio do público, só ali, só em Chamonix, só no UTMB.
A partida foi de loucos…… pensei! Vamos fazer uma prova de 168 km ou apenas com meia dúzia de km? Tentei reduzir o ritmo para padrões aceitáveis, mas até Les Houches o ritmo foi sempre mais alto que o previsto. Só na primeira subida é que os ânimos acalmaram e tudo foi ficando mais organizado até ao km 31 em Contamines. Até aí a chuva esteve sempre presente e só deu uma trégua já na subida para Crolx du Bonhomme. Seguiu-se o Col de la Seigne e já na descida para Courmayeur comecei a ter problemas de estômago, o que me levou a reduzir bastante o ritmo e fazer a primeira de quatro “paragens” inesperadas. Em Courmayeur fiquei algum tempo para troca de roupa e para restabelecer um pouco o organismo. Saí pouco convicto e senti uma falta de força tremenda na subida para o refúgio de Bertone.
Na pior fase física fui brindado com a parte mais bonita do percurso. Para mim a chegada a Bertone e os trilhos que se seguem até Bonatti são de cortar a respiração!
Já com um cansaço difícil de controlar cheguei ao abastecimento de Arnuva, o local onde se inicia a dura subida para o Grand Col Ferret. Após algum tempo de descanso continuei rumo aos mais de 2500 metros de altitude e curiosamente consegui recuperar o ânimo e ultrapassar aquele paredão enorme. Na descida já não posso dizer o mesmo! A descida nunca mais acabava e muito lentamente cheguei ao abastecimento de La Fouly. Já na trajeto para Champex-Lac tive o prazer de ter a companhia da nossa atleta Ester e juntos chegamos ao abastecimento. Aí parei novamente para me alimentar bem e descansar um pouco.
Saí completamente vazio de vontade em correr mais um metro que fosse. Fisicamente ainda com força, mas mentalmente desanimado e com a motivação pela ruas da amargura. Aí valeram os telefonemas de apoio dos meus amigos Nelinhos. Foram fantásticos, fico-vos eternamente grato!
Com três grandes subidas por ultrapassar, fui negociando todos aqueles desafios com um cuidado “paternal” e a vontade de correr apareceu novamente.
Após passar a última dificuldade, a Tête aux Vents, super divertido e motivado, percebi que se não me ocorresse nada de extraordinário iria terminar mais um desafio.
A chegada foi plena de emoção, pelo feito atingido e pela alegria explanada em muitos amigos presentes. Paulo Nuno Vieira, Nuno André, Vitor Faustino, Paulo Carvalho e Filipe Rodrigues
Obrigado também à Catarina Neves, que desta vez à distância, preencheu a minha mente e deu-me força durante as trinta horas.

Venha a próxima!

Enviado por António Silva (através da página http://nel.pt/colabora/)